quinta-feira, 29 de março de 2018

O ENCONTRO, A MESA E O AMOR

A Santa Ceia, Obra de Aleijadinho em Congonhas do Campo


Casa iluminada, 
Belas  flores,
Mesa posta,
Tu me chamas e me esperas,
Porque me amas.
E eu espero em Ti
Por Ti eu clamo,
Porque também Te amo.
Anseio por este encontro.
As inquietações são tantas!
Hesito em dar o primeiro passo.
O que fazer com as intempéries?
Entre a minha casa e a Tua
Há um caminho a ser construído.
Fico entre a fome de partilhar da tua mesa
E o medo de enfrentar
A construção do caminho
E se me faltar luz?
Se me faltar força?
E se a tempestade vier?
Se o sol esquentar demais?
E se ninguém me acompanhar?
O que farei com as pedras ou
Com os espinhos que eu encontrar?
Em meio às indagações
Que me acorrentam,
O desejo por encontrar-te
Me toma,
Eu quero,
Anseio,
Desejo ardentemente
Estar contigo,
Sentar-me à esta mesa que
Para mim preparaste,
Ficar aos teus pés
Para escutar a tua Palavra
E experimentar o teu amor.
Quando contemplo,
Na imagem da Santa Ceia,
o discípulo que amavas
reclinado em Ti,
Anseio por estar no lugar dele,
Tão próximo do Amor
Ali partilhando a mesma mesa.
Será interesseiro o meu amor?
Ir ao Teu encontro por causa da fome?
Ir ao Teu encontro por causa da mesa posta?
Estar na tua presença,
Estar contigo e
Viver esse amor é o que mais quero
As consequências desse amor
Me amedrontam
Mas a fome grita
E o coração arde
Já estou indo!

Gilmara Belmon

terça-feira, 27 de março de 2018

REVERÊNCIA

      Foto: George Roberto



Descansarei a palavra,

Pelo menos por um instante

Silenciarei tudo que há em mim

Pois, nem tudo se pode expressar,

Dizer, explicar



Como a beleza da Hortênsia,

Diante da qual emudeço

Como o encanto da poesia,

Diante da qual estremeço

Como o cuidado de um amigo,

Que por vezes não mereço



Se eu pudesse transformar

Tudo em palavra,

A primeira coisa que faria

Seria dizer do teu olhar,

Que me causa um fascínio e

Outra coisa que não sei nomear



Ah palavras que me faltam,

Metáforas que me traem,

Por vezes enuncio

O que nem queria dizer

Há uma ilusão

No coração do poeta,

A de pensar que tudo pode tocar

Pelo poder da sua poesia



Mas há igualmente uma certeza:

Diante daquilo que a palavra não alcança,

O nosso ser reverencia.



Gilmara Belmon


quinta-feira, 15 de março de 2018

REVERSO



Há dias em que a palavra
Pede silêncio
Então se cala para o silêncio falar

Há dias em que o  pastor
Vê-se na condição de ovelha
Pois também ele precisa de cuidado

Toda mãe tem seus momentos de filha
Porque às vezes precisa de colo

E o jardineiro? Ele tem seu dia de planta,
Quando reconhece que
Também precisa ser adubado

Há dias em que o escritor quer ser papel
Porque anseia por se deixar marcar

Não há nesse mundo cuidador
Que não precise de cuidado,
Encantador que não seja encantado,
Duvido que haja neste mundo quem ame
E não deseje ser amado.

Gilmara Belmon



quinta-feira, 8 de março de 2018

Oito de Março





Como diria Cora Coralina:
“Eu sou aquela mulher...”
Que une a sua voz
À voz de tantas outras mulheres
Que, numa atitude de resistência,
Recusam as homenagens no dia dedicado a elas
Por vezes, dizer “não”
Quando todos esperam ouvir um “sim”
É a única forma de sermos ouvidas
Não queremos que nos deem voz
Voz nós temos
Queremos os ouvidos e os olhares atentos
De uma sociedade que insiste em
Não nos ouvir e em não nos ver como realmente somos
Recusamos homenagens no dia de hoje
De quem passa os outros 364 dias do ano
Reproduzindo discursos, piadas, músicas que nos inferiorizam
Recusamos homenagens no dia de hoje
De quem passa os outros 364 dias do ano
Indiferente às lutas de tantas mulheres
Que precisam gritar para que compreendam o óbvio:
O direito de ser mulher
Nem igual, nem menor, nem maior do que o homem
Recusamos homenagens no dia de hoje
Que, mais do que ser celebrado,
Existe para que mulheres e homens
Reflitam, apoiem e reforcem a luta contra
Tudo que viola, que violenta, que inferioriza
O direito da mulher de ser mulher
Fora dos padrões determinados
Pela sociedade hipócrita
Que naturaliza o pensamento machista
Que oprime, ridiculariza,
E destitui a mulher da sua dignidade
E justamente o dia de reforçar a reflexão e a luta
É transformado em  dia de  homenagem
Não se trata aqui de uma ode ao fracasso,
As lutas não foram vãs
A história nos mostra isso
É antes um alerta
Para que o dia Internacional da Mulher
Não se restrinja a um dia de homenagens
Sem reflexão e sem luta.

Gilmara Belmon


ESCREVER E OFERTAR

Trago dentro de mim uma sede de justiça, É por isso que, paradoxalmente, Meu ser transborda de esperança. A indignação me acompanha t...